ARACAJU/SE, 26 de abril de 2024 , 9:56:16

logoajn1

“Músicos estão vendendo seus instrumentos para sobreviver”

Por Wilma Anjos

O presidente do Sindicato dos Músicos Profissionais do estado de Sergipe (SINDMUSE), Tonico Saraiva, conversou com o Correio de Sergipe a respeito da situação dos artistas em meio à pandemia da Covid-19. Prejudicados pela suspensão de shows e eventos no estado, os profissionais receberam recursos emergenciais da Lei Federal Aldir Blanc ano passado, mas o repasse não foi por muito tempo e as dificuldades permaneceram. Tonico pede mais sensibilidade por parte do governo do Estado.  Por enquanto, Tonico diz que a categoria está recebendo ajuda da sociedade e, para se virar, alguns músicos estariam vendendo seus instrumentos a preços irrisórios. Acompanhe:

Correio de Sergipe: Qual a atual situação dos artistas?
Tonico Saraiva
: Hoje é de crise total! Muita dificuldade para alimentar suas famílias, sem poder trabalhar.

CS: Pelo último Decreto, bares e restaurantes poderão abrir de segunda a sábado. A notícia agradou?
TS: Na realidade todos os Decretos não foram bons para nós, e ao mesmo tempo estão nos salvando. Então, botando na balança, é uma coisa só, no final de tudo. Os músicos não conseguem trabalhar. Tem esses Decretos, mas aí vem o comércio e abre, mas o músico não pode trabalhar no bar. Quando se fecha a cidade, tem que dar um apoio. Na Constituição Federal diz que quando fecha um estado, uma cidade, os governantes têm que dar o auxílio. É uma obrigação deles. Pernambuco está dando, a Bahia vem dando, Alagoas está dando, o Ceará vem dando, enfim, vários estados vêm dando auxílio para que os músicos não fiquem expostos. Mas aqui em Sergipe estamos encontrando dificuldade nessas negociações com o governo do estado. Acho que temos que aproveitar esse momento agora e chamar a atenção mais uma vez do governo do estado, Belivaldo Chagas, que disse na campanha dele que chegou para resolver. Quando a gente diz que chegou para resolver, então tudo que acontecer na sua chegada você tem por obrigação resolver, porque você fez uma campanha em cima disso. Por mais dificuldades que ele tenha, mas se ele tem que encontrar um caminho, que o músico sergipano não passe tanta dificuldade, porque os músicos já entregaram as casas que moravam, estão morando nas casas de parentes. Estão vendendo seus instrumentos e não têm nem quem compre. Alguém que consegue, vende pela metade do preço, por menos 20%. Tem outras pessoas que já montaram loja de instrumentos usados no interior, que ganha R$ 20,00 para poder vender. Eu liguei para um cara essa semana que estava com cinco baterias de bandas que deixaram lá. Ele ganha R$ 20,00 em cima de uma venda dessa, mas os donos das bandas vão perder seus instrumentos, e quando abrir para trabalharmos, eles não vão ter mais esses instrumentos. Então, os Decretos, o auxílio, acabaria com isso. Os músicos não mais venderiam seus instrumentos, nem os donos das bandas. Pedimos aqui, em nome do Sindicato dos Músicos, que o governo do estado procure uma maneira, uma forma de pagar esse auxílio aos músicos sergipanos.

CS: Mas vocês tiveram algum auxílio?
TS:
Durante a crise, logo no começo, tivemos aquele auxílio do Governo Federal, de R$ 600, que ajudou demais os artistas, os músicos sergipanos, a enfrentarem essa crise. Mas esperávamos que quando acabasse aquele, entrasse o do estado, mas infelizmente no estado de Sergipe os governantes não nos escutam.

CS: Refere-se aos recursos da Lei Federal Aldir Blanc, não é? Eles atenderam às expectativas?
TS: A Lei Aldir Blanc chegou na melhor hora para salvar a nossa música brasileira. Eu posso dizer que durante esses 20 anos nunca tivemos uma Lei tão boa como está sendo a Lei Aldir Blanc. O nosso maior desafio aqui no Sindicato era que os músicos fossem respeitados diretamente, sem ter atravessador para fechar o contrato. Foi o maior desafio do SINDMUSE, lutar que os músicos recebessem esse dinheiro da Lei Aldir Blanc diretamente na conta do músico, sem empresários. Não é que sejamos contra os empresários, é porque quem deve ganhar esse dinheiro é quem toca e canta. E está na hora de o músico ser respeitado, e ele contrate quem ele queira para trabalhar com ele, para ajudar no trabalho dele. Mas que o empresário mesmo é o próprio músico, quem recebeu o dinheiro da Lei Aldir Blanc, direto na conta dele. Foi um dinheiro bem pago. Músico em Sergipe nunca viu tanto dinheiro como dessa vez. Mas dinheiro acaba. Muitos estavam devendo, estavam em situação difícil. Quando esse dinheiro chegou, limparam as contas, pagaram a quem deviam. Então, isso ajudou demais, até.

CS: E foi aberta alguma linha de crédito para ajudar vocês?
TS:
A linha de crédito foi o Banese que abriu para Pessoa Física e Pessoa Jurídica. Alguns artistas não conseguem, outros já conseguiram, mas a maioria não consegue fazer. Está em análise e fica nisso a vida toda, e o músico vendendo o que tem para poder comer.

CS: Os músicos mais prejudicados seriam os trios pé de serra e as bandas de forró, sem os festejos juninos presenciais pelo segundo ano?
TS: Não temos como falar quem foi mais prejudicado. Eu diria que 100% de quem é músico nesse estado está sendo prejudicado. Acho que se tiver que vir alguma coisa boa para os nossos músicos como um auxílio, tem que vir para todo segmento da cadeia produtiva. É uma cadeia muito grande e precisa ser valorizada para sair dessa pandemia. Não existe quem foi mais prejudicado. Todos foram prejudicados.

O Forró Caju, o Arraiá do Povo, na Orla, e os forrós dos 75 municípios a gente os chama de 13º do músico, porque é o único mês do ano em que o músico aqui no nosso estado mais ganha dinheiro. Vamos dizer assim: para quem toca forró, perdeu o 13º do músico sergipano, e não sabe quando vai voltar.

CS: As contratações das lives são uma boa saída ou deixaram de fora algum gênero?
TS:
Elas são muito importantes nessa pandemia. São elas que vêm salvando milhares de músicos no nosso estado, porque aquele artista, músico, cantor que tem um nome melhor e está em evidência na mídia faz uma live e consegue muitas doações de alimentos e os distribui para o segmento. O cara que monta o som, o que opera a luz, o operador de áudio, os trabalhadores no geral são beneficiados por esses artistas maiores que fazem as lives. Seria interessante aproveitar o gancho e pedir que a sociedade continue ajudando. Entrem lá no QR Code daquele artista e faça uma doação no valor que você pode, porque quem vem salvando os artistas, músicos sergipanos é a sociedade. Criamos a campanha S.O.S. músico no ano passado. Durou oito meses e conseguimos muitas toneladas de alimentos. O estado é grande, são 75 municípios. A gente não tem condições de continuar com a campanha porque existem gastos também. Combustível, alimentação para passar o dia todo na rede de supermercado pedindo. Temos despesa também. Tinha dias que tinha comida e tinha dias que não tinha. Ajudar a sociedade que está passando dificuldade é papel dos governantes, principalmente no segmento da Música, que sempre trabalha para a sociedade, para o povo, municípios. Sem o São João ficou muito difícil para todos nós.

CS: O que vocês estão fazendo para não deixar de produzir durante a pandemia?
TS:
Por causa dos recursos da Lei Aldir Blanc, 1.600 músicos foram contratados. Vai surgir muitos trabalhos novos. Na realidade, pela primeira vez o músico teve condições de ir para um estúdio de gravação que tem boa qualidade e gravar um CD que possa concorrer com os artistas nacionais, em termos de qualidade de som. Porque não é só gravar. Tem que ter qualidade, porque a emissora de rádio lá em outros municípios vai tocar o CD do Safadão e depois vai tocar o CD de um artista sergipano. Aí quando bota o sergipano ele tem que ter qualidade também. Em questão de cachê, a Lei Aldir Blanc está ajudando muito. Acredito que em meados de julho vamos ter muitos trabalhos de músicos, artistas, cantores sergipanos sendo lançados através da Lei Aldir Blanc. Isso é importante.

Você pode querer ler também