ARACAJU/SE, 7 de maio de 2024 , 23:32:29

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As Virtudes e o Amor a Deus

Em muitas passagens do Antigo Testamento, existe uma atribuição a Deus de caracteres tipicamente humanos, que tentam elucidar ao povo da Antiga Aliança o zelo por parte do amor do Senhor, seu Deus. Dentre estas características está o fato de o próprio Deus denominar-se ‘ciumento’ (cf. Ex 20,5 et al.). Não que Ele, em Sua perfeição, o seja. Mas, esta imagem de ciúme – fracassada em sua linguagem – designa que o seu amor não tolera rivais; é um sentimento de zelo pelo amado.
É bem verdade que este dado de inserir em Deus um sentimento tipicamente humano – como é o ciúme – refere-se à uma possível prevaricação de Israel ao Deus único e verdadeiro. Igualmente hoje, para o novo Povo de Deus – os cristãos, será uma denúncia às nossas infidelidades. Entretanto, consolar-nos-á o que disse São Paulo: “Se formos infiéis… ele continua fiel, e não pode desdizer-se” (2Tm 2,13).
Deus revela-se. Por primeiro, Israel, pedagogicamente, vai sendo apresentado ao único Deus, ao seu Libertador, que lhe manifesta a Sua glória. Em Cristo, sobremaneiramente, temos a revelação completa de Deus e do Seu amor pela humanidade, quando da cruz do Redentor. Descobrindo Deus que Se deixa conhecer, a humanidade, “imagem e semelhança de Deus” (Gn 1,26), vai igualmente se descobrindo, e encontrando o seu sentido autêntico de viver.
Para tanto, o Senhor Deus, nas Suas infinitas Sabedoria e Providência, também nos dá os meios necessário para conhecê-Lo; dá-nos as virtudes que nos permitirão mergulhar no Seu mistério. E assim, as virtudes teologais ser-nos-ão aliadas para este conhecer Deus. Por virtudes teologais, entendamos aquilo que o Papa São Pio X, em seu Catecismo, nos oferece: “Chamam-se a Fé, a Esperança e a Caridade virtudes teologais porque têm a Deus por objeto imediato e principal e nos são infundidas por Ele. […] porque pela Fé nós cremos em Deus, e cremos em tudo o que Ele revelou; pela Esperança esperamos possuir a Deus; pela Caridade amamos a Deus e n’Ele amamos a nós mesmos e ao próximo […] Deus, pela sua bondade, infunde-nos na alma as virtudes teologais, quando nos adorna com a graça santificante; e por isso, quando recebemos o Batismo, fomos enriquecidos com estas virtudes” (Catecismo de São Pio X, questões 855-857). Se temos como primeiro preceito do Decálogo o “Amar a Deus sobre todas as coisas”, juntamente com este, teremos a obrigação de nos abrir aos dons das virtudes teologais infundidas por Deus em nós.
Pela virtude da fé, vivemos com maior fidúcia o amor a Deus com a perspectiva de testemunhá-Lo. Desta maneira, “o primeiro mandamento manda-nos alimentar e guardar com prudência e vigilância nossa fé e rejeitar tudo o que se lhe opõe” (Catecismo da Igreja Católica, 2088). Esquivando-nos das dúvidas ou mesmo da incredulidade, abrindo-nos a ação de Deus que revela, ousaremos viver de fé.
Consciente de que não pode responder plenamente ao amor que se lhe é cumulado por Deus, o homem deve esperar esta capacidade como um dom que se lhe é derramado profusamente. “A esperança é o aguardar confiante da bênção divina e da visão beatífica de Deus; é também o temor de ofender o amor de Deus e de provocar o castigo” (Catecismo da Igreja Católica, 2090). Segundo São Paulo, o ato de esperar não é uma perda de tempo, porque “a esperança não engana” (Rm 5,5). Esta espera, que por vezes é acompanhada de certas dificuldades, ansiedades e obstáculos, deve aliar-se à paciência e à fé (cf. Rm 5,3-4), porque não esperamos como fim último esta vida, e isto nos adverte o Apóstolo dos Gentios: “se é só para esta vida que temos colocado a nossa esperança em Cristo, somos, de todos os homens, os mais dignos de lástima” (1Cor 15,19). E outra: São Paulo também nos enceta o como adquirimos e alimentamos esta virtude teologal, quando nos diz: “esperança que vos foi transmitida pela pregação da verdade do Evangelho” (Cl 1,5). Vivendo de esperança, afastamos de nós a presunção e o desespero de não-salvação.
Naturalmente ao conteúdo do amar a Deus, temos a virtude da caridade. Percebemos que amar não é somente um preceito, mas uma força que caracteriza, profundamente, a relação de Deus com o homem e vice-versa, porque a criatura humana só tem forças para amar Deus, amando-O sinceramente. A partir desta atitude, afastamos de nós os pecados contra o amor de Deus: a indiferença, a ingratidão, a tibieza e, o pior de todos, o ódio a Deus, proveniente do orgulho, na negação de Sua bondade e da fragilidade humana.
As virtudes, em síntese, são dinamismos dados por Deus para o sustento daquele que deseja cumprir os mandamentos do Senhor. Aproveitando o dispor de nossa abertura, Deus permite-nos servi-Lo com maior inteireza e profundidade, sempre respeitando a nossa liberdade interior. O dito popular atribuído a Deus “Faça que eu te ajudarei” é inspirado nesta conduta de amar e ser auxiliado para tanto. Concedendo-nos as virtudes tão necessárias, o Senhor nos ajuda a amá-Lo. Amemo-Lo, pois, como imperativo.