Vladimir Souza Carvalho
vladimirsc@trf5.jus.br – magistrado
Na fixação dos honorários do vencedor, em obediência ao §2º, do art. 85, do Código de Processo Civil, necessário, antes de tudo, o exame do desempenho do advogado na questão em exame. A norma não faz alusão expressa ao exame, usando tão somente o verbo atender. Isto é, atendidos os critérios delineados nos seus quatro incisos, onde se alojam as matérias a serem cotejadas. Já no §3º – exclusivo das questões em que a Fazenda Pública é parte -, a norma determina a observância dos aludidos critérios enfiados nos tais incisos, além dos percentuais a serem aplicados.
Dos dois exames, ou, a depender das partes, seja só o do §2º, o resultado é positivo ou negativo. Se positivo, busca-se na conclusão, por critérios equitativos, verificar se a aplicação é do menor ou de outro percentual que não ultrapasse o máximo ali estendido. Mas, se o resultado for negativo, se o trabalho do advogado vencedor não se reveste de complexidade, não se alonga o feito no tempo, sua participação se limita a inicial, etc., os casos são vários -, está o julgador obrigado a aplicar um percentual entre os indicados pelo §2º: mínimo de dez e máximo de vinte?
Justamente aí mora o pecado. Nadando contra a maré, tenho defendido que não. Não se justifica, em ação com valor da causa alto ou altíssimo, na elaboração de simples inicial, matéria sumamente batida, o advogado do vencedor seja premiado com honorários de dez a vinte por cento (caso do §2º) sobre o valor atualizado da causa.
No entanto, para não deixar dúvidas no sentido de que qualquer exame é ato sem nenhuma relevância, formalidade que não resulta em nada, o § 6º traz a cacetada final e letal: Os limites e critérios previstos nos §§ 2º e 3º aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito. Ou seja, em qualquer ação, sem nenhuma exceção, a aplicação do §2º é obrigatória. Se a Fazenda Pública participa do feito, adentra-se no §3º. No fundo, o que se espreme de realidade é que a liberdade do julgador, nesses casos, se limita, única e exclusivamente, a escolha do menor percentual para os casos de pouca monta no que se refere ao desempenho do advogado vencedor, ou de percentual maior que não ultrapasse aquele que a norma estabeleceu.
Há um conflito bem visível entre os §§ 2º e 3º e o §6º. Se o legislador conferiu ao julgador a tarefa de verificar se os critérios estatuídos nos quatro incisos do §2º legitimam ao trabalho tido pelo advogado vencedor o rótulo positivo, e, de outro lado, se §3º, no seu caput, se prende aos critérios estabelecidos nos incisos I a IV do §2º, a determinação consagrada no §6º rasga os dois aludidos parágrafos, transformando o exame em papel imprestável, análise absolutamente inútil, porque, qualquer que seja a conclusão, positiva ou negativa, o julgador é obrigado a aplicar um dos percentuais, o que redunda, no que já foi afirmado anteriormente, na mera e diminuta tarefa do julgador de tão só escolher os menores percentuais, ultrapassando a etapa do exame.
Não vejo outra conclusão. Depois, me chama a atenção o lamentável fato do §6º não se referir ao desempenho do advogado vencedor, elegendo tão só o conteúdo da decisão, assentando bem contundente que, por ser, v. g., matéria repetitiva, de conclusão já consolidada nas instâncias recursais e especiais, – na Justiça Federal é mui rotineira -, e igualmente, nos casos de improcedência ou de sentença sem resolução do mérito, os critérios dos §§ 2º e 3º devem ser aplicados, obrigatoriamente, o que consolida a intenção do legislador de não deixar nenhuma fenda onde o julgador possa enfiar solução não prevista nos vinte e dois incisos do art. 85. A sentença é o espelho que reflete a lide, e, dentro desta está o desempenho do advogado vencedor. Qualquer que seja a sentença, curta ou longa, apoiando-se em casos idênticos, ou enfrentando situações novas, a conclusão é uma só: o juiz é obrigado a aplicar os limites dos percentuais e os critérios fincados nos §§2º e 3º.
Triste realidade. O julgador não passa de gerente de banco a adotar as taxas que a direção geral estabelece para todas situações, bastando conferir as resoluções internas com o cenário vivido. Daí estarmos a ver e a legitimar arbitramento absurdo em demandas extintas sem resolução do mérito, – é só um exemplo – na qual, por força do alto ou altíssimo valor da causa, os honorários devidos ao advogado do vencedor alcançam patamares exorbitantes. Enquanto isso, grande parte dos eminentes profissionais, seja do particular, seja da Fazenda Pública, espera a vez de ser beneficiada, cada um defendendo a aplicação de ditos parágrafos quando se torna deles o destinatário. Só então o vencedor acha justa a norma.