Vladimir Souza Carvalho
Magistrado
Tenho defendido, reiteradamente, que a aplicação dos §2º e §3º, do art. 85, do Código de Processo Civil, não é automática, não se igualando a um carimbo que o julgador utiliza na fixação dos honorários, independentemente da situação factual entranhada nos autos. Não concebo a simplicidade na qual, em geral, a matéria está sendo acarada, no momento em que o recurso desce para cumprir decisões da Corte Especial ordenando a aplicação dos §2º e 3º.
Destaco dois verbos como fundamentais na discussão, colhidos nos dois parágrafos mencionados. No §2º, atender. No § 3º, observar.
O significado de atender, entre outros, é verificar se os seus quatro incisos ensejam resultado positivo. Não seria, em espécie alguma, simples consulta, independentemente da conclusão que possa extrair. O resultado há de ser, compulsoriamente, positivo, em sua plenitude, inciso por inciso, coroando a operação com essa flama, na etapa inicial de fixação dos honorários. Não fosse assim, o legislador não teria colocado quatro incisos no §2º, reiterando o verbo atender utilizado no §3º, do art. 20, da lei processual civil revogada. Teria, então, encerrado o §2º com a alusão ao valor atualizado da causa. Mais nada.
Somente com o resultado assertivo, a depender da presença da Fazenda Pública, se embrenha no §3º, onde o verbo observar se aloja, como a dizer que nele só se atinge se tiver sido ultrapassado o mais crucial obstáculo, materializado nos critérios hospedados nos incs. I a IV, do §2º, a exigir conclusão positiva. O resultado faz com que se penetre no § 3º, ficando, agora, guiada a matéria apenas pelo valor da condenação ou do proveito econômico obtido, ou, não sendo ainda possível, se buscar guarida no inc. III, do §4º, do mesmo art. 85, para o valor atualizado da causa servir como parâmetro. Este, o caminho correto.
Em conclusão, a análise inicial da situação factual integra a operação por força do verbo atender. Depois e enfim, se invoca o verbo observar. Em hipótese alguma, fica divorciada dos dois verbos, sob pena de gerar mostrengos, afastando-se completamente da intenção do legislador, para gerar exorbitantes honorários em benefício do vencedor que, na prática, limitou-se a trabalho de pouca monta, tramitando o feito em curto período, sem se cuidar de matéria complexa. É apenas um exemplo/caso.
A determinação, que está se tornando comum, no sentido do julgador da instância revisora fixar expressamente os honorários com a aplicação dos §§ 2º e 3º, do art. 85, sem alusão alguma a situação factual, ou seja, sem abrir o caixão para se ver o defunto, não exclui do julgador, alvo da determinação, do dever de cotejar os dois aludidos parágrafos com o panorama que os autos exibem, cumprindo, fielmente, as normas agasalhados nos §§2º e 3º. Em conclusão, se o §2º está em jogo, o verbo atender comanda a ação; se é o §3º, há de se observar os critérios agasalhados no §2º. Em um, verificar se atende. No outro, a observação da conclusão anterior, se foi positiva ou não. Os dois verbos se tocam.
Não há como fechar os olhos ao exame do §2º, obrigatória que é a sua observância, não se constituindo os quatro incisos do §2º em letras mortas, dada a presença dos verbos atender e observar no caput dos dois parágrafos, devendo ser cumpridos, independentemente das decisões superiores a eles não fazerem menção ao cotejo da situação factual. Aliás, nem precisa a menção. É a lei que ordena a realização da operação. A clareza brota bem esbugalhada, mesmo sem referência no decisório superior.
A luz desponta nos dois verbos – atender e observar. Se atende, todos os critérios se realizam, a operação prossegue; se, ao contrário, desatendem, tudo paralisa, dali não se dá um passo adiante, não abrindo as portas do §3º. O observar é uma forma de constatar se os critérios aludidos foram devidamente atendidos. Os dois verbos não são irmãos siameses, mas estão fortemente ligados.
O resultado negativo faz rebentar situação factual que não encontra cadeira para ocupar no meio dos vinte e dois parágrafos, deixando o julgador regiamente livre a fim de arbitrar os honorários sem nenhum empeço, se escorando em seu senso de justiça, com moderação e motivadamente, – na sábia dicção do §1º, do art. 64, do Código de Processo Civil/1939, – pairando em quantia certa, levando em conta o cenário que o feito desenha. Não pode deixar é de arbitrá-los sob o argumento da ausência de um parágrafo a lhe dar apoio.
Enfim, não se concebe que os critérios dos quatro incisos do §2º, por si só, mesmo com resultado negativo, sejam suficientes para abrir as portas do §3º, desprezando o peso e influência dos dois aludidos verbos – atender e observar -, não podendo estes serem encarados como literatura vã, ciente todos que atender e observar se ligam, o primeiro preparando o caminho para o segundo percorrer.
É como entendo.