ARACAJU/SE, 22 de outubro de 2024 , 10:37:08

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Lei Maria da Penha atinge a maioridade: superando desafios – (2)

Adélia Moreira Pessoa

A pesquisa e a prática no Direito das Famílias, em atenção às mulheres em situação de violência, possibilita-nos observar os avanços ao longo dos 18 anos da Lei Maria da Penha. Contudo, a Lei Maria da Penha -Lei 11.340/2006 – e as leis posteriores que a complementam não se efetivaram integralmente na vida de muitas mulheres, motivo pelo qual a ampliação e o aprofundamento dos estudos e dos debates segue tão necessária para a criação e o aperfeiçoamento das estratégias que garantam a efetividade no enfrentamento à violência de gênero, o que passa, necessariamente, pelas instituições públicas, com envolvimento de todos os poderes do estado e da sociedade, na garantia de um acesso concreto ao direito de viver sem violência .

Muitas são as campanhas de conscientização para que as mulheres rompam o ciclo da violência e busquem os direitos que já lhes são garantidos tanto pela Constituição e Convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, quanto pela Lei Maria da Penha e demais normas legais. Porém, apesar desses avanços normativos e das políticas públicas implementadas, o acolhimento e o suporte integral às mulheres em situação de violência ainda constituem desafios a serem superados, sobretudo nos procedimentos de espera pela resposta jurisdicional.  

Na prática, a partir do momento em que as mulheres se deparam, em muitos locais, com a necessidade de ajuizarem uma série de procedimentos fragmentados entre as Varas de Família e as de Violência Doméstica, ou mesmo Varas Cíveis e Criminais, o caminho torna-se ainda mais penoso quando as vítimas vivenciam uma intersecção de múltiplas outras vulnerabilidades, à exemplo das socioeconômicas e estereótipos de cor e raça.  

É possível afirmar que essa realidade contraria as diretrizes de enfrentamento integral e especializado à violência doméstica contra as mulheres, muitas das quais consagradas pela Lei Maria da Penha, pela Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW).

 Desde 2006, a Lei Maria da Penha prevê a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, com competência cível e criminal, e a concessão de medidas protetivas de urgência voltadas não apenas para o distanciamento do ofensor, mas também para a proteção dos filhos menores e do patrimônio conjugal, evidenciando as perspectivas de atenção integral e especializada. E, desde 2019, em seu art. 14-A a possibilidade de a ofendida propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável nesses juízos especializadosEntretanto, em vários estados isso não vem sendo aplicado em sua necessária extensão, resumindo-se, geralmente, às medidas protetivas de urgência – e mesmo assim nem todas medidas previstas na lei, pois as medidas protetivas patrimoniais, por exemplo, são, inúmeras vezes, desconsideradas no juízo de violência doméstica. 

URGE, assim, buscarmos coibir a revitimização das mulheres em situação de violência, abrindo o debate sobre isso para atender ao acesso adequado à justiça. E, na linha do que explicita a Des. Alice Birchal, do TJMG no texto ‘JUIZADO ÚNICO DE COMPETÊNCIA HÍBRIDA: ponte para a proteção integral da família vitimada pela violência doméstica, é necessária a instituição de Juizados Únicos de Família e Violência Familiar com a unificação efetiva das matérias cíveis e criminais, nos casos em que incidam a violência doméstica e familiar contra a mulher. 

 É indispensável que o estado brasileiro ofereça respostas e mecanismos com novas nuances, para que se preservem direitos e garantias das mulheres, entrecruzando o direito público e o privado o criminal e o cível, de modo a que estruturas seculares sejam rompidas, ajudando a solucionar parte das controvérsias e dilemas para um acesso à justiça que atenda à Recomendação Geral 33 do Comitê da Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, da Organização da Nações Unidas – CEDAW/ONU, que diz: “O direito de acesso à justiça é multidimensional. Abarca a justiciabilidade, disponibilidade, acessibilidade, boa qualidade, provisão de remédios para as vítimas e a prestação de contas dos sistemas de justiça. (…) O efetivo acesso à justiça otimiza o potencial emancipatório e transformador do direito.” 

Que as lentes de Gênero sejam aplicadas efetivamente em todo o sistema de Justiça, extirpando a fragmentação da jurisdição, possibilitando um eficaz acesso à justiça: ‘Para uma família – um juízo’. Precisamos de todas as entidades, de todas as pessoas, na luta por um mundo em que a mulher possa viver sem violência e para que cada FAMILIA SEJA UM LAR – Lugar de Amor e Respeito.