Vladimir Souza Carvalho
vladimirsc@trf5.jus.br – magistrado
Quando o Superior Tribunal de Justiça devolve autos à Turma originária para fixação dos honorários de acordo com as diretrizes dos §§2º e 3º, do art. 85, do Código de Processo Civil, não significa que a Turma, compulsoriamente, deva aplicar ao caso os dois aludidos parágrafos, ou só o primeiro, a depender da participação ou não da Fazenda Pública no feito. Fosse assim, não haveria necessidade do legislador colocar quatro situações fáticas nos incisos que fazem o §2º, bastando asseverar no seu caput ser este de cumprimento obrigatório, o que deixaria o julgador sem espaço para escapar da ordem da instância especial.
A deliberação em foco é justificada pelo fato do §2º se constituir na porta de entrada no que tange ao arbitramento dos honorários. É porta central, não se trabalhando na fixação dos honorários sem beber sua água, vangloriando-se o §2º, aliás, com razão, de ser o mais importante de todos os parágrafos do art. 85, marcando presença em cinco outros irmãos. Muito natural que a disposição do Superior Tribunal de Justiça indique apenas o caminho a ser seguido, no caso de arbitramento dos honorários, materializado no §2º, sem aludir a operação a ser realizada.
Não é ordem a ser cumprida na risca, por exigir, na sua execução, o cotejo da situação factual que os autos exibem com as circunstâncias que se penduram nos quatro incisos, em busca de resultado conclusivo. A investigação, esta, sim, compulsória, dentro do §2º, inicialmente, capta do caput as diretrizes impostas, de caráter objetivo – 1ª) o percentual de honorários, a ser aplicado, variando de dez para vinte por cento; 2ª) recaindo sobre o valor da condenação, ou do proveito econômico obtido, 3ª) ou ainda, não sendo possível mensurá-los, sobre o valor atualizado da causa. Depois, entranha-se no juízo subjetivo, aferindo as situações factuais hospedadas nos seus quatro incisos, cada um a encerrar uma circunstância. No meio das duas, o verbo atender, finalizando o exame com resultado positivo na análise do trabalho do advogado no feito, a ser contemplado com um dos percentuais indicados no §2º ou no 3º; ou negativo, se o trabalho não passar pelo crivo do §2º.
Não há novidade. As circunstâncias espalhadas nos incisos pendurados do §2º se voltam para o trabalho do advogado da parte vencedora, sob a óptica do grau de zelo, lugar de prestação do serviço, natureza e importância da causa, tempo gasto na sua execução. São fatos exclusivamente ligados ao desempenho do advogado, independentemente do tempo desenvolvido pelo feito da inicial até a sentença, marco para a fixação dos honorários, que, de acordo com o vigente Código de Processo Civil, se destinam ao advogado. É o trabalho do advogado que vai legitimar a aplicação ou não do §2º ao caso vivido.
Não é operação tipo carimbo, que dispensa qualquer examinação. Não é ordem do Superior Tribunal de Justiça para ser cumprida de todo jeito, de olho fechado. Atire, e o soldado atira. Não é assim tão simplório. Tudo se volta para cotejo do §2º. Neste, sem ser objeto de qualquer referência da decisão superior, por sua total desnecessidade, situa-se o verbo atender, no final do caput, a ligar o comando geral ao seu conjunto, que, é esmiuçado, circunstância por circunstância, para se extrair juízo positivo, como a dizer que os critérios fáticos foram amplamente satisfeitos, o trabalho do profissional justifica a incidência do §2º, e, sendo a Fazenda Pública parte, como autora ou como ré, se ingressa em um dos percentuais alojados nos incisos que formam o §3º, que, afinal, não passa de uma mera tabela de preços, ressaltando-se que este não tem vida própria, dependendo da análise que se faça dos critérios fáticos dos incisos do §2º, para, então, se positiva, para ela as vistas se voltarem, tomando como parâmetro o valor da condenação ou do proveito econômico obtido, só invocando o valor atualizado da causa se não houver condenação principal ou não sendo possível mensurar um dos dois. Ou, não foram atendidos, resultado negativo, e, então, a incidência do §2º não se legitima, o julgador, à míngua de outro parágrafo, fica livre para arbitrar os honorários de acordo com o seu senso de justiça, louvando-se na moderação e motivação, segundo recomenda o §1º, do art. 64, do Código de Processo Civil de 1939, vivo apenas como orientação.
A determinação do STJ não proíbe nem dispensa o vasculhar as circunstâncias do feito em parelho com os critérios fáticos do §2º. O sinal verde está no fato deste não fazer a menor referência a situação factual, por ser ônus do julgador esmiuçá-la. Pena que, encandeado pela chama do édito superior, o exame afundar no lixo. Os critérios fáticos passam ao largo, o verbo atender, do final do §2º, troca sua posição de elo de ligação pelo de mero adorno, despeado de qualquer valor. É como tenho visto.