ARACAJU/SE, 18 de abril de 2024 , 23:48:52

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A vinha do Senhor

Dentre as imagens utilizadas pelo Senhor para designar o Seu povo está a da vinha; é uma figura bastante presente na literatura bíblica. Justamente sobre a “Vinha de Deus” é que, nesta ocasião, iremos refletir.

Comecemos vislumbrando o Profeta Isaías: “Cantarei para o meu amado a minha canção de amor por sua vinha: o meu dileto, o meu amado, possuía uma vinha sobre uma colina fértil” (Is 5,1). É bom que saiba, estimado leitor, que este trecho de Isaías é um canto que pode ser tido como uma moção ao trabalho dos vinhateiros de Israel naquela época, durante a colheita. Mas, não se trata de um canto atrelado à dinâmica de um trabalho agrícola, é sim de um canto de amor, porque, no Antigo Testamento (mais precisamente no Cântico dos Cânticos), a vinha é símbolo da mulher amada, a “vinha florida” (Ct 2,13). Entretanto, ao sentido agrário e romântico junta-se o religioso, que vê na vinha o ato de Deus em amar Israel: “Pois bem, a vinha do Senhor dos exércitos é a casa de Israel, e o povo de Judá, sua dileta plantação” (Is 5,7).

Sobressai neste cântico de amor espiritual a espera e a surpresa desagradável que o amado vinhateiro tem. Confessa: “[…] eu esperava deles frutos de justiça – e eis injustiça; esperava obras de bondade – e eis iniquidade” (Ibidem); e ainda: “O que poderia eu ter feito a mais por minha vinha e não fiz? Eu contava com uvas de verdade, mas por que produziu ela uvas selvagens?” (Is 5,4). Eis o lamento do Senhor.

Nos Salmos, vemos a interessante síntese da história de Israel com base no amor de Deus, que o elegeu e o constituiu Sua herança. Observamos que, mesmo eleito, Israel é constantemente infiel, com uma resposta ingrata ao amor divino que cumula a vinha constituída de afeição. Diante da falta de reconhecimento de Israel para com Deus, temos a decisão divina de desfazer-se do que fora plantado, e, a isto, o lamento do povo ingrato: “Por que razão vós destruístes sua cerca, para que todos os passantes a vindimem, o javali da mata virgem a devaste, e os animais do descampado nela pastem?” (Sl 79,13). A esta sentença, temos o grito de perdão da vinha, que, recordando o amor e a fidelidade de Deus, se compromete em corresponder às Suas iniciativas de predileção ao que plantou: “Voltai-vos para nós, Deus do universo! Olhai dos altos céus e observai. Visitai a vossa vinha e protegei-a! Foi a vossa mão direita que a plantou; protegei-a, e ao rebento que firmastes! E nunca mais vos deixaremos, Senhor Deus! Dai-nos vida, e louvaremos vosso nome! Convertei-nos, ó Senhor Deus do universo, e sobre nós iluminai a vossa face! Se voltardes para nós, seremos salvos!” (Sl 79, 15-16.19-20).

O Senhor, na Sua fidelidade, não volta atrás. Ele não destrói a Sua vinha; antes, a transmuta, não desistindo de Sua obra de amor e misericórdia. Se o Profeta Isaías disse-nos, claramente, que “a vinha do Senhor dos exércitos é a casa de Israel, e o povo de Judá, sua dileta plantação” (Is 5,7), pelo que nos diz Jesus no Evangelho de Mateus (cf. 21,33-43), sabemos que esta bendita plantação continua, agora sob a responsabilidade de outros vinhateiros. Não mais sob o vão trabalho dos sumos sacerdotes judeus e dos maiorais do antigo Israel, mas sob o zelo do povo cristão e dos seus pastores, operários conquistados com um alto preço de amor, que lhes compensa o árduo empenho: o sangue do Filho, que não foi reconhecido pelos outrora vinhateiros, mas jogado para fora da vinha e assassinado (cf. Mt 21,37-38). Os novos vinhateiros somos nós, que acolhemos o Cristo na fé e na correspondência do amor que Ele nos tem: “‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto foi feito pelo Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos’? Por isso eu vos digo: o Reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos” (Mt 21,43). A vinha renovada do Senhor é a Sua Igreja Católica, plantada pelo Senhor e cuidada também por nós; prova de que o Dono da Vinha não desiste de Sua obra.

Falando aos discípulos, na noite da Quinta-Feira Santa, o Senhor disse: “Eu Sou a videira verdadeira, e o meu Pai é o agricultor [é o vinhateiro]. Todo ramo que em mim não dá fruto, ele o corta, e todo ramo que dá fruto, ele o poda para que dê mais fruto” (Jo 15,1-2). Vejam que mistério: ao tempo em que somos vinhateiros, somos ramos da única videira, Jesus Cristo, e devemos estar enfincados em tão nobre tronco, que nos comunica a seiva de Sua graça, garantindo a nossa vida. Estando no tronco-Cristo, frutificamos. Mas, o que devemos produzir? “Tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor. […] Assim o Deus da paz estará convosco” (Fl 4,8-9).

Vinhateiros, vinha, ramos e uvas, envolvidos no mistério do amor de Deus por nós, zelemos por Sua obra redentora, sendo corresponsáveis nos assuntos relativos ao Agricultor e à Sua Igreja. Eis o nosso dever, a nossa missão.