ARACAJU/SE, 24 de abril de 2024 , 10:09:25

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Consultas [informais] ao juiz

Chato na magistratura é a consulta que a gente se vê compelido a responder, por força dos vínculos de amizade/conhecimento, não podendo ser descortês em circunstância alguma. Numa dessas, eu caminhava na calçada na frente da casa de meu pai, já há alguns e muitos anos, depois do jantar, quando, de repente, um conhecido, ali por perto, se aproximou e puxou conversa. Em verdade, era uma consulta que queria me fazer, aproveitando-se de minha solitária caminhada. E fez. Introdução manhosa, partiu para os nove fora, indagando, como quem não queria nada, acerca da situação de um cunhado, fora de Itabaiana, problemas trabalhistas.  Foi um senhor discurso, com exposição de tudo, para me perguntar o que eu achava.

A vontade era de responder que nada achava, porque nada tinha perdido. Me contive, jogando também alguns considerandos a fim de enfatizar do fato se cuidar de matéria de direito trabalhista, que não fazia parte da minha rotina diária. Destaquei a necessidade de consultar um advogado da área, para se sentir bem seguro, me aventurando em alguns conselhos de praxe, feijão com farinha na matéria, ao que o meu interlocutor, entre uma tragada e outra, me revelou que o advogado do cunhado teria respondido do mesmo jeito.

Em outra, a pedido de meu irmão, ouvi um conhecido, réu em ação penal, acusado de ter sapecado aposentadoria rural a quem não era rurícola. O que devia fazer?  Ora, contratar bom advogado e dizer a verdade, que sempre é uma só, enfatizei. Tempo empós, me apareceu para comunicar a condenação. E, impiedosamente, jogou a culpa em mim: O senhor mandou que eu falasse a verdade. Assim fez. Foi condenado. Expliquei. Como juiz, não aconselharia a mentira. A condenação se calcou em prova documental a três por dois de tudo de errado que foi feito. É sempre assim. A confissão até o ajudou a minorar o tamanho da pena. A conversa foi rápida. Depois, depois, me brotou a dúvida se, no início, me procurou em busca de uma orientação ou de apoio, na esperança de se falar com o magistrado que dirigia o feito, hábito que nunca tive, nem vi nenhum colega fazê-lo em mais de quarenta anos de magistratura. Se correta a segunda suspeita, lamentavelmente, não só perdeu a viagem, como quebrou a cara.