Pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus (Grageru)
Na Ladainha do Sagrado Coração de Jesus, há uma invocação bastante sugestiva: “Coração de Jesus, Rei e Centro de todos os corações!”. Por ela, em Cristo, vemos que se torna clara a realização da promessa de Deus Pai pelo profeta Jeremias: “Dar-vos-ei pastores segundo o meu coração, os quais vos apascentarão com inteligência e sabedoria” (3,15). Assim, é-nos bastante interessante o deparar-nos com o real significado de tais caracteres: inteligência e sabedoria.
Por inteligência, entendamos o que o termo latino, inteligere, comporta: a leitura por dentro, um conhecimento profundo acerca de algo, ou mesmo, de alguém. Nesta reflexão, fiquemos, exatamente, com a noção: inteligência é o conhecimento da profundidade do outro. No Salmo 38, se lê: “Senhor, vós me perscrutais e me conheceis, sabeis tudo de mim, quando me sento ou me levanto. De longe penetrais meus pensamentos. Quando ando e quando repouso, vós me vedes, observais todos os meus passos. A palavra ainda me não chegou à língua, e já, Senhor, a conheceis toda. Vós me cercais por trás e pela frente, e estendeis sobre mim a vossa mão. Conhecimento assim maravilhoso me ultrapassa, ele é tão sublime que não posso atingi-lo” (Sl 138,1-6). Em torno destas palavras do Salmo, esconde-se a belíssima promessa divina: “Eu mesmo vou apascentar as minhas ovelhas e fazê-las repousar. […] Vou procurar a ovelha perdida, reconduzir a extraviada, enfaixar a da perna quebrada, fortalecer a doente, e vigiar a ovelha gorda e forte” (Ez 34,15-16).
O Senhor, Bom Pastor, conhece as nossas debilidades, os nossos cansaços, as nossas misérias. Sabe de que “barro” somos feitos, das nossas necessidades, e Se oferece como nosso alento. Isso é manifestação da inteligência de Deus, que sonda os corações, conhecendo-nos, imensamente mais, do que aquilo que julgamos conhecer de nós mesmos. Compadecendo-Se da humanidade, conduz-nos ao Seu misericordioso Coração dilatado por nós, ferido para esgotar-Se [se é que Deus Se esgota] até o extremo, até o inimaginado por qualquer homem que seja. O Coração de Jesus é o prado que todos ansiamos, até mesmo aqueles que não têm a devida consciência de que somente a intimidade do Senhor, Bom Pastor, pode nos saciar inteiramente, e, assim, se perdem por vias pecaminosas, pelos caminhos dos erros e dos vícios. Tão-somente no Sagrado Coração de Jesus encontramos as delícias que precisamos.
Mas, o Profeta Jeremias também nos oferece outra característica do Belo Pastor a nós prometido por Deus Pai: a sabedoria, que é um dom divino de saber ver as coisas com o profundo olhar de Deus, cuja lógica difere – e muito – da lógica humana, por vezes, matematicamente, pontuada. E qual é a lógica do Rei Pastor? Temos na Parábola das cem ovelhas, onde Jesus diz: “Se um de vós tem cem ovelhas e perde uma, não deixa as noventa e nove no deserto, e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la?” (Lc 15,4). Jesus sempre deseja mais almas. E isto de deixar no deserto as noventa e nove que já são suas, o que significa? São Cirilo nos responderá: “Como é que abandona todas as demais e só tem caridade apenas para com uma? De nenhum modo. Todas as demais se encontram em seu rebanho, defendidas por sua destra poderosa. Mas, devia compadecer-se mais da perdida, para que não ficasse incompleto o resto de suas criaturas. Uma vez recolhida esta, o número cem recobra sua perfeição”.
Ainda na Sua lógica sapiente, Jesus nos oferece mais uma imagem de Seu pastoreio: ao invés de reconduzir a ovelha desgarrada por vias violentas, quem sabe até, sob castigos e pancadas, põe-na aos ombros. E esta é uma carga de forte sentido: imaginem o calor e o suor sentidos pelo corpo do pastor, o seu cansaço, o esgotamento de suas energias; e quando a ovelha é reencontrada, ele faz questão de sentir o ranço exalado pelo animal, aquela lã a esquentá-lo ainda mais, não obstante o calor do clima desértico; o peso que leva aos ombros, oprimem-no apesar de sua fadiga… o pastor mistura-se à sua ovelha. E esta imagem se torna infimamente inferior ao que de fato aconteceu: quando o Verdadeiro Pastor e Rei veio ao nosso encontro, fazendo-Se gente como a gente, “graças à bondade e o amor de nosso Deus, que nos veio visitar” (Lc 1,78), encarnando-Se.
Esta é a dinâmica de Deus, o Rei que governa no amor, e, por isso, faz festa, alegra-Se com os amigos (espero que conosco, as noventa e nove ovelhas que Lhe permaneceram, ainda que, por vezes, sejamos a fujona). E, por fim, desabafa, em regozijo: “Eu vos digo: Assim haverá no céu mais alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove justos que não precisam de conversão” (Lc 15,7). E é nesta sabedoria todo-poderosa de Deus, que há o juramento ainda apresentado por Ezequiel da parte do Belo Pastor-Rei: “Vou apascenta-las conforme o direito” (34,16). E que direito é este? O do amor que Deus sente por nós.
O Coração de Jesus é Rei e Pastor. O Seu cetro e o Seu cajado são a Sua Cruz redentora, por meio da qual salvou a todos, quando ainda éramos pecadores: isto é prova mais que suficiente de Seu amor por nós.