ARACAJU/SE, 28 de abril de 2024 , 8:30:01

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A limitação dos juros anuais do cartão de crédito a 100% do valor da dívida: benefícios e desafios

O cartão de crédito é um dos meios de pagamento mais utilizados pelos brasileiros, mas também um dos que mais geram endividamento e inadimplência. Segundo dados do Banco Central, em outubro de 2023, a taxa média anual dos juros do rotativo do cartão de crédito era de 445,7%, a mais alta entre todas as modalidades de crédito. O rotativo do cartão de crédito ocorre quando o cliente não paga o valor total da fatura e joga a dívida para o mês seguinte, acumulando juros e encargos.

Para tentar reduzir o impacto dos juros abusivos sobre os consumidores, o governo federal sancionou em outubro de 2023 a lei que limita os juros rotativos do cartão de crédito e regulamenta o Desenrola, programa de renegociação de dívidas. Pela lei, a partir de ontem, os juros e encargos cobrados no crédito rotativo e no parcelamento das faturas não podem ultrapassar o valor principal da dívida. Isso significa que se uma pessoa não pagar uma fatura de 100 reais, por exemplo, a cobrança de juros e encargos pelo banco nunca poderá ultrapassar os mesmos 100 reais iniciais, totalizando 200 reais, independentemente do prazo.

Essa medida pode trazer diversos benefícios para o consumidor, a exemplo da diminuição do custo do crédito e facilitar o pagamento da dívida, evitando que ela se torne impagável; estimular o uso consciente e responsável do cartão de crédito, incentivando o planejamento financeiro e o controle dos gastos; beneficiar as famílias mais pobres, que são as mais vulneráveis aos juros altos e às armadilhas do crédito fácil; reduzir o risco de superendividamento e de comprometimento da renda com dívidas, melhorando a qualidade de vida e o bem-estar dos consumidores.

No entanto, a limitação dos juros também pode trazer alguns desafios, como aumentar a inadimplência, caso os consumidores se sintam mais confortáveis em atrasar o pagamento da fatura, confiando na limitação dos juros; reduzir a oferta de crédito, caso os bancos e as operadoras de cartão de crédito diminuam o limite ou as condições de acesso ao crédito, para compensar a perda de receita com os juros; encarecer outras modalidades de crédito, caso os bancos e as operadoras de cartão de crédito aumentem os juros de outras linhas de crédito, para compensar a perda de receita com o cartão de crédito; gerar distorções no mercado de crédito, caso os bancos e as operadoras de cartão de crédito criem novas taxas ou encargos para burlar a limitação dos juros.

Para avaliar o impacto da limitação dos juros do cartão de crédito, é interessante fazer um comparativo com o ano de 2017, quando as taxas de juros do cartão de crédito ultrapassavam a casa dos 700% em alguns casos de operadoras de crédito. Naquele ano, o governo federal também tentou intervir no mercado de crédito, impondo uma regra que limitava o uso do rotativo do cartão de crédito a 30 dias. Após esse período, o cliente teria que pagar o valor total da fatura ou parcelar a dívida com juros menores. Se bem que não foi isso que aconteceu.

A medida teve como efeito praticamente imediato a redução dos juros do rotativo do cartão de crédito, que caíram de 497,5% ao ano em janeiro de 2017 para 334,6% ao ano em dezembro de 2017. No entanto, também teve como efeito o aumento dos juros do parcelamento do cartão de crédito, que subiram de 161,9% ao ano em janeiro de 2017 para 169,2% ao ano em dezembro de 2017. Além disso, a medida não teve impacto significativo na inadimplência, que se manteve em torno de 38% ao longo de 2017. Em 2023, os juros parcelados já ultrapassavam a casa dos 500% em algumas operadoras de cartões.

Portanto, é possível concluir que a limitação dos juros do cartão de crédito a 100% do valor da dívida é uma medida que pode beneficiar o consumidor, mas que também pode trazer alguns riscos e desafios. Para que a medida seja efetiva, é preciso que o governo fiscalize o cumprimento da lei e evite que os bancos e as operadoras de cartão de crédito criem novas formas de cobrar juros abusivos. Além disso, é preciso que o consumidor tenha educação financeira e consciência do uso do cartão de crédito, evitando o endividamento excessivo e buscando alternativas mais baratas e seguras de crédito.