ARACAJU/SE, 18 de maio de 2024 , 15:41:54

logoajn1

A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do 8 de janeiro

Na semana passada, foi criada a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para investigar os ataques às sedes dos três Poderes ocorridos em 8 de janeiro deste ano.

Tentativa de golpe de estado, invasão dos prédios dos três Poderes, com vandalismo e depredação do patrimônio público, foram alguns dos crimes praticados naquela oportunidade, surpreendendo a sociedade brasileira e o mundo.

A instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito é uma prerrogativa constitucional do Poder Legislativo (e, nele, da minoria parlamentar consistente em pelo menos um terço dos membros da Casa Legislativa) para o bom exercício da sua função típica fiscalizadora.

Com efeito, as CPI’s constituem instrumentos importantíssimos para o bom desempenho desse papel, tendo em vista que, criadas regularmente, possuem poderes de investigação “próprios das autoridades judiciais” (Art. 58, § 3° da Constituição Federal – “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.”). A jurisprudência do STF já se firmou no sentido de que esses “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais” são, na verdade, poderes “de instrução”, poderes de “produção de provas” próprios das autoridades judiciais, eis que as autoridades judiciais não possuem poderes de investigação.

E os requisitos constitucionais para a criação de Comissão Parlamentar de Inquérito são três: a) requerimento de, no mínimo, 1/3 dos Deputados ou 1/3 dos Senadores, sendo que em se tratando de CPI mista, o requerimento deve ser subscrito por no mínimo 1/3 dos Deputados e 1/3 dos Senadores; b) que a CPI seja criada para apuração de fato determinado; c) prazo certo de funcionamento, renovável, sempre por prazo determinado (noutras palavras, é uma comissão temporária) [Tendo em vista que a CPI, por dispor dos poderes mencionados, pode vir a adotar medidas eventualmente restritivas de direitos fundamentais, não seria conveniente permitir a sua existência por tempo indeterminado].

Todos esses requisitos foram devidamente atendidos e o fato de as investigações já estarem em estágio relativamente avançado sob a alçada da Polícia Federal e supervisão judicial do Supremo Tribunal Federal não é impeditivo da instalação e funcionamento de uma CPMI para investigação dos mesmos crimes.

Convém apontar o diferencial da investigação parlamentar em relação às cotidianas investigações policiais: o acompanhamento público mais direto e constante e a problematização política dos eventos examinados, como é próprio das atividades do Parlamento, o que pôde ser constatado mais uma vez nos trabalhos da “CPI da Pandemia” de 2021.

A curiosidade do caso é apenas a circunstância de que, normalmente, uma Comissão Parlamentar de Inquérito é legitimamente utilizada por minorias parlamentares que fazem oposição ao governo e pretendem, com a CPI, criar embaraços políticos na apuração de eventuais crimes cometidos em sua órbita.

Ocorre que, a toda evidência, o atual Governo Federal, assim como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, foram vítimas dos crimes de 8 de janeiro de 2023, e a iniciativa política da criação dessa CPMI foi de grupos parlamentares que mantêm lanços estreitos com o Governo anterior e que pretendem emplacar uma narrativa de que esses crimes foram praticados mediante armação ou complacência do atual Governo, com supostos propósitos de vitimização.

Inicialmente, a base parlamentar de apoio ao atual governo se posicionou contra a CPMI, seja por entendê-la desnecessária, seja por não querer que esse tema ocupasse espaços públicos protagonistas, ofuscando iniciativas governamentais na seara social e econômica, mas a divulgação de imagens do 8 de janeiro com ainda inconclusivas condutas de membros do Gabinete de Segurança Institucional praticamente forçou essa base parlamentar a não somente abandonar a posição contrária como também a apoiar a sua criação, para ter nela voz ativa e atuante.

Seja como for, o importante é que a investigação parlamentar tem tudo para contribuir na elucidação precisa e detalhada desses graves crimes cometidos, para apontamento dos responsáveis em todas as esferas, propiciadoras dos julgamentos, observado o devido processo legal, com as adequadas e justas punições, como elemento fundamental de preservação da democracia.